O anúncio feito pelo governador João Dória sobre a parceria com o laboratório chinês Sinovac Bitotech para a produção pelo Instituto Butantan de uma vacina contra o coronavírus acendeu o sinal de alerta: por que fabricar e testar o produto no estado de São Paulo?
Segundo uma reportagem recente do The New York Times, os líderes chineses capacitaram uma indústria de vacinas que há muito tempo está envolvida em problemas e escândalos de qualidade.
Há dois anos, pais chineses entraram em pânico ao descobrirem que vacinas ineficazes foram aplicadas em seus filhos, principalmente em bebês.
O jornal diz ainda que “as empresas de vacinas chinesas estão acostumadas a um sistema político fechado, que tem um histórico de encobrir escândalos de segurança e os protege da concorrência estrangeira. Poucos investem pesadamente em pesquisa e desenvolvimento e não descobriram muitos produtos com impacto global.”
Além disso, muitos investem mais em vendas e distribuição, grande parte das quais inclui o gerenciamento de relacionamentos com os centros locais de controle de doenças. Especialistas dizem que esse fator cria incentivos para a corrupção.
FALTA DE CONFIANÇA
Embora a China lidere a corrida para ser o primeiro país a encontrar a vacina para a covid-19 – há quatro indústrias farmacêuticas incentivadas pelo governo -, é preciso primeiramente conquistar a confiança do seu próprio povo.
“Os chineses agora não têm confiança nas vacinas produzidas no país e essa provavelmente será a maior dor de cabeça”, disse Ray Yip, ex-chefe da Fundação Gates na China, ao New York Times.
A PARCERIA COM O BRASIL
O Sinovac Biotech é um dos quatro laboratórios chineses autorizados pelo governo chinês a fazer testes clínicos. Em 2009, foi o primeiro no mundo a encontrar uma vacina para a gripe suína H1N1. Tem hoje uma equipe de mil funcionários.
Mesmo sem a conclusão da eficácia da vacina, o Sinovac já construiu uma fábrica no sul de Pequim, com capacidade para a produção de 100 milhões de doses por ano. Deve entrar em operação no final de 2020.
Em seu laboratório, já foram feitas as fases 1 e 2 dos testes para a covid-19. Eles têm a missão de verificar se a vacina, batizada de Coronavac, é perigosa para os humanos.
Estava faltando a fase 3, que avalia a capacidade do imunizante atuar na prevenção da doença, mas precisa ser realizada em portadores do vírus, o que envolve milhares de pessoas.
“Não é fácil obter esse número em nenhum país”, disse recentemente Meng Wining, diretor de relações internacionais do Sinovac, à AFP.
Eles estavam negociando fazer os estudos com a Europa e a Ásia. Mas, aí entrou o estado de São Paulo.
A parceria, segundo o governo estadual, prevê o início da fase 3 para o início de julho, contará com 9 mil voluntários e investimentos do Estado de R$ 85 milhões. A vacina está prevista para junho de 2021.
O diretor do Instituto Butantã disse que a expectativa é usar os centros com os quais o Instituto já tem parceria para realizar os estudos.
São 16 centros de pesquisa no Brasil, que já participaram do estudo clínico da vacina contra dengue, criada pelo Butantan.
Diante desse quadro, há algumas questões que precisam de respostas:
Por que o Estado vai investir R$ 85 milhões no estudo de um laboratório privado chinês, que estava com dificuldades para encontrar milhares de voluntários para a fase mais importante? Não deveria ser ao contrário?
Por que ambos países vão produzir a mesma vacina simultaneamente?
A fabricação em São Paulo seria um selo de qualidade para a vacina ser aceita pela comunidade internacional?
Afinal, se nem os próprios chineses confiam, por que os brasileiros devem confiar?
O Ministério Público Federal precisa investigar melhor essa história!